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#Stella Cristiani Gonçalves Matoso

Microrganismos do solo: os aliados do agricultor

O efeito da adubação nitrogenada de arranque na FBN.

O produtor rural, o técnico, o auxiliar e muitos extensionistas de campo têm dúvidas. Há necessidade de realizar a adubação com nitrogênio mineral em culturas como soja e milho, quando as sementes foram inoculadas com bactérias capazes de fixar nitrogênio atmosférico? Qual o efeito da adubação nitrogenada de arranque sobre a Fixação Biológica de Nitrogênio?

Analisando a distribuição do nitrogênio (N) na natureza, constata-se sua predominância na composição do ar atmosférico de 78%, o que permite configurar em reservatório praticamente inesgotável, uma vez que existem processos que reabastecem constantemente a atmosfera. No entanto, apesar dessa abundância, a forma de N presente no ar não é diretamente utilizada pelas plantas, sendo a Fixação Biológica de Nitrogênio (FBN) o único processo biológico de obtenção de N, que pode beneficiar as plantas. O processo de FBN é realizado por um grupo restrito de organismos ditos diazotróficos, com destaque para bactérias que vivem em simbiose e em associação com as plantas. Essas bactérias contêm o complexo enzimático da nitrogenase, sendo capazes de quebrar a tripla ligação que une os dois átomos de nitrogênio atmosférico e fazer a redução do N2 a amônia (NH3+).

Nesta premissa, como ocorre a FBN em soja e qual o efeito da adubação nitrogenada? Em soja o processo simbiótico é realizado por bactérias do gênero Bradyrhizobium que colonizam as raízes da planta via pelos radiculares, formando nódulos e fornecendo em média entre 85 e 94% da exigência de N pela planta, sendo o restante complementado principalmente pelo solo a partir da decomposição da matéria orgânica. Resultados obtidos por diversas instituições de pesquisa em diferentes regiões produtoras de soja no Brasil, demonstram e confirmam que a aplicação de fertilizante nitrogenado reduz a nodulação e não incrementa a produtividade da soja em nenhum estádio de desenvolvimento da planta.

No campo é comum o uso de formulações que tragam alguma quantidade de N, e as mais utilizadas resultam em um aporte bruto na ordem de 20 kg/ha de N, o que corresponde a um aporte líquido de 10 kg/ha de N, considerando que a eficiência de utilização dos fertilizantes nitrogenados raramente ultrapassa 50%. Desse modo, o uso de fontes que tragam N pode ser feito somente se forem mais econômicas que as fontes sem N e não devem ultrapassar 20 kg/ha de aporte líquido de N, para não trazer prejuízos à nodulação. E porque essa quantidade de N, mesmo que pequena, influencia negativamente a inoculação? O N do fertilizante é mais facilmente absorvido pela planta, pois se encontra em uma forma prontamente disponível, ao passo que, no processo biológico de FBN, a planta precisa investir energia inicial na formação de nódulos. Qual a lógica disso? A planta irá optar pelo caminho mais rápido e com menor gasto de energia.

Então, produtor, técnico, auxiliar ou extensionista, não é necessário investir em adubo nitrogenado só para dar “aquele arranque inicial” na soja, visto que o N mineral é um fertilizante caro e não adiciona efeitos positivos na produtividade da cultura, sendo a prática totalmente desnecessária.

E na cultura do milho como ocorre a FBN? As recomendações quanto à adubação nitrogenada de arranque são iguais à cultura da soja? Dentre as bactérias capazes de se associar às raízes de milho e realizar a FBN destacam-se as espécies do gênero Azospirillum, que diferentemente dos rizóbios em simbiose com as leguminosas, estas bactérias não formam nódulos, porém colonizam a superfície das raízes, rizosfera [região do solo com delimitação física de 2 e 3 milímetros ao redor das raízes, oscilando de acordo com o estágio de desenvolvimento vegetal] e até o interior do tecido vegetal, excretando somente parte do N fixado diretamente para a planta associada. Ou seja, há a necessidade de contribuição com aporte adicional de N à cultura. Essa estratégia de combinar a inoculação com a aplicação de fertilizantes nitrogenados pode possibilitar a substituição de até 40% da dose recomendada de N para cultura do milho.

Diversos estudos mostram que a inoculação associada à aplicação de apenas 24 kg/ha de N na semeadura, não afeta o processo de FBN e garante rendimentos à cultura na ordem de 3400 kg/ha, que são economicamente relevantes para a agricultura familiar. Já com a suplementação adicional em cobertura de 30 kg/ha de N é possível alcançar produtividades superiores a 7000 kg/ha permitindo à cultura expressar seu máximo potencial produtivo e caracterizando-se relevante para agricultura altamente tecnológica. Todavia, cuidados com a suplementação elevada de N devem ser observados, pois pode afetar negativamente a atividade das bactérias quanto à FBN, visto que para a planta há gasto de energia nesta associação.

Então, produtor, técnico, auxiliar ou extensionista, é necessário investir em adubo nitrogenado para dar “aquele arranque inicial” no milho, visto que o N mineral associado à inoculação possibilita incrementos significativos na produtividade da cultura, sendo a prática totalmente necessária para garantir a expressão do máximo potencial produtivo. E nesse caso, tanto o produtor quanto o vendedor de fertilizantes, ganham.

Reflita sobre isso no próximo plantio, e certifique-se da utilização de inoculantes registrados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), dentro do prazo de validade, e que a inoculação seja bem feita seguindo rigorosamente as orientações técnicas indicadas para cada produto e o método de inoculação (veja nosso artigo “Cuidados com os inoculantes e com a inoculação”, da série “Microrganismos do solo: os aliados do agricultor”, publicado aqui na revista).

A exploração e a utilização da FBN em sistemas agrícolas visando o suprimento total ou parcial do N fornecido por meio de fertilizantes industriais é uma estratégia fundamental, ecologicamente correta e economicamente viável, essencial à agricultura sustentável e ao agronegócio mundial.

Autoria de:

Erica de Oliveira Araújo1; Roberta Carolina Ferreira Galvão de Holanda1; Rosalba Ortega Fors2; Jessica Danila Krugel Nunes3; Stella Cristiani Gonçalves Matoso1; Angelita Aparecida Coutinho Picazevicz4;

¹  Professora Doutora do Instituto Federal de Rondônia, Campus Colorado do Oeste;

² Doutora em Ciência do Solo pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro;

³ Professora Mestra e Doutoranda do Instituto Federal de Rondônia, Campus Ariquemes;

4 Professora Doutora do Instituto Federal de Rondônia, Campus Cacoal.

Contato: gpsam.colorado@ifro.edu.br

 

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